O Palco de um Artista


Ele seguia por ruas já conhecidas, passos leves carregando sonhos antigos. Nos bolsos, apenas alguns trocados; na cabeça, o mesmo boné de sempre; à tiracolo, o violão que o pai lhe dera ainda menino, guardando dentro de cada corda a promessa de um desejo antigo. O coração pulsava com a urgência de quem quer tocar o impossível, de quem quer sentir a realização na ponta dos dedos.

No ponto de ônibus vazio, respirou fundo e fechou os olhos. Um aplauso invisível preenchia o ar, sussurrando a admiração de uma plateia que só existia em seus pensamentos. Por alguns segundos, o mundo desapareceu. Só restava ele, só restava o sonho, só restava a música.

O primeiro ônibus surgiu no horizonte, e ele acenou com o coração acelerado. Uma euforia silenciosa subiu pelo peito, quase fazendo escapar um grito contido. Era agora ou nunca. Subiu, ignorando o cansaço estampado no rosto do motorista. Um cumprimento, um sorriso largo como resposta, e o mundo voltou a se inclinar a seu favor. Escolheu o lugar mais confortável, olhos atentos à paisagem que desfilava lá fora, cada detalhe inspirando acordes que ainda não haviam nascido.

Enquanto o ônibus avançava, lembranças se misturavam a sonhos: os acordes da canção mais linda que já ouvira, a expectativa de um público imaginário, o arrepio que só a música desperta. O ponto final chegou, e ele desembarcou, passos apressados em direção ao seu palco. Ali, na calçada que conhecia como próprio corpo, sentiu a familiaridade como abraço. Tirou o boné, pousou-o ao lado, e começou a afinar o violão, cada corda vibrando com a liberdade que só a música pode oferecer.

Poucos minutos depois, uma canção tristonha emergiu, embora seu coração transbordasse de alegria. Pessoas surgiam, atraídas por uma magia invisível. De olhos fechados, dedos dançavam sobre as cordas, criando melodias que penetravam na alma de quem ouvia. Olhos marejados, respirações suspensas, corações tocados por algo que jamais imaginariam sentir. Quando a última nota morreu, um aplauso infinito tomou a rua, ecoando como um abraço coletivo.

Aquela calçada, aquela rua, eram seu palco, sua plateia, sua casa. Ali, entre acordes e aplausos, ele existia em plenitude. Ali, ele era inteiro, ele era música, ele era sonho.

— Diego Dittrich

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